sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Fernandinha

Tem dias maravilhosos.

Sobretudo os dias que se transformam em noites; tempestuosas, com chuva, muita; ventos, fortes; trovões, enormes... rolo de lã crua e branca, botas pantufa mole e fofa e crianças enroscadas e aninhadas como almofadas e gatos rãs. Tem dias que se transformam em noites em que os contos nos escorrem pelas fontes. Tem dias que se transformam em noites onde as crianças sobem febres em busca de um Amen. Tem dias transformados em noites em que a bíblia ou o terço saem do armário, junto aos álbuns e as cartas amarelas, entorpecidas, esborratadas, amarrotadas que falam de vidas, outrora minhas, outrora nossas. Tem dias que se transformam em noites onde o ponto cruz e a manta grossa voltam a fazer sentido, não porque se gosta de ponto cruz mas porque a memória se estende como um véu até ao céu e se cruza com a morte. Tem dias que se transformam em noites onde o barulho de um interruptor velho significa absolutamente tudo. Tem dias que se transformam em noites em que o cheiro do bolo quente inexistente invade o Hall e a cozinha como se uma forma latente estende-se uma ponte entre o antes do antes de ontem e o hoje, tem dias que se transformam em noites em que te chamo com a certeza de que ainda estas aqui.

Avó.

Senti-te.

B

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